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“Todos os arguidos intervenientes em cada uma das agressões a ofendidos acima descritas atuaram em comunhão de esforços, querendo atingir a integridade física e a vida dos ofendidos, por serem indivíduos de raça negra.” Esta foi a conclusão do Supremo Tribunal de Justiça quando condenou os envolvidos na noite de 12 de junho de 1995, em que Alcindo Monteiro foi assassinado e vários afrodescendentes foram espancados no Bairro Alto, em Lisboa, por um grupo organizado de neonazis. Entre eles estava Mário Machado, que depois disto se notabilizou por uma longa carreira de crimes pelos quais também foi sendo condenado a duras penas de prisão, naquilo a que a juíza agora chamou de “processo de ressocialização”.
No dia 20 de outubro, o tribunal decidiu condenar por difamação o ativista antirracista Mamadou Ba por ter escrito que Mário Machado foi “uma das principais figuras do assassinato de Alcindo Monteiro”. Não apenas por defender com empenho a violência sobre as minorias, mas por, naquela noite fatídica, ter atuado em “comunhão de esforços” com o objetivo de “atingir a integridade física e a vida dos ofendidos, por serem indivíduos de raça negra”, espancando vários deles com um pau.
Quando Mário Machado decidiu lançar uma campanha de charme mediático para regenerar a sua imagem (falando até de erros judiciais), sem nunca abandonar o seu discurso de ódio, foram muitos os que recordaram o seu cadastro criminal e político. Como deixou claro num vídeo que publicou, o dirigente neonazi escolheu os alvos dos seus processos com critérios políticos, opção que confirmou no momento da condenação. Curiosamente, o único que chegou a julgamento, por decisão do juiz Carlos Alexandre, foi Mamadou Ba.
Quando a justiça falha, e sendo feita por humanos ela pode sempre falhar, e contribui para a normalização do ódio e do racismo, servindo para branquear o passado e o presente de alguém que mantém ambições políticas, os cidadãos exigentes têm o dever de contribuir para que ela seja corrigida. É para nós intolerável que o Estado de Direito seja usado por neonazis para silenciar a verdade e condenar a resistência ao racismo.
Mamadou Ba não foi escolhido como alvo preferencial por razões pessoais ou porque as suas acusações tenham sido as mais explícitas ou com maior visibilidade. Foi escolhido por Mário Machado por ser negro, por ser um português nascido no Senegal, por ser um dos rostos mais conhecidos da luta antirracista. Por ousar levantar a cabeça e a voz em nome de muitos. E é nesta altura que temos de dizer que ninguém larga a mão de ninguém.
Mamadou Ba já fez saber que usará os instrumentos que o Estado de Direito lhe garante para levar a justiça até às últimas instâncias, Tribunal Europeu dos Direitos Humanos incluído, se tal for necessário. Sabemos que essa é uma caminhada onerosa. E sabemos que a sua luta é mais do que sua. É de todos nós. De democratas que resistem ao crescimento dos fascismos e recusam o regresso das monstruosidades do passado.
Os abaixo-assinado apelam a que contribuam para um fundo que terá como primeiro objetivo cobrir a totalidade das custas judiciais e despesas conexas do processo de Mamadou Ba, que falou em nosso nome. A verba sobrante, se adesão for a que esperamos, será usada para casos similares ou de violência policial e racismo, com garantias de transparência no montante conseguido e nas despesas a que é destinado. O valor recebido por essa campanha, que será aplicado para cobrir os custos citados acima, será integralmente enviado ao Mamadou, através de transferência em conta bancária de sua escolha.
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