A polícia está detendo aqueles rotulados de “anarcos”, enquanto livros são, mais uma vez, coletados como evidência. Estará a Indonésia testemunhando o retorno de velhos hábitos autoritários?

Por Fadiyah Alaidrus | 18/09/2025

Jorgiana Augustine (28), estudante de pós-graduação em Direito que trabalha como assistente jurídica voluntária, participa do Dia do Trabalhador em Jacarta vestindo somente uma camiseta azul, leggings e uma bolsa tipo sling. Jorgiana, também conhecida como Oji, planeja sair com os amigos depois do evento, esperando que a manifestação permaneça pacífica, ao contrário de muitos protestos recentes em Jacarta. A atmosfera festiva, com bandas se apresentando em um palco na frente do prédio da Câmara dos Deputados, parece confirmar o seu otimismo.

Ela não esperava que a sua participação a tornasse suspeita, com a mídia nacional a identificando como uma “intrusa anarquista” no protesto. Essa caracterização surgiu depois que a polícia deu uma entrevista coletiva, fazendo tais alegações.

“O uso do termo ‘intrusa anarquista’ carrega uma conotação negativa, fazendo parecer que a palavra ‘anarquista’ é criminosa, quando na verdade é apenas uma ideologia ou ideia”, diz Oji.

Oji é uma das 14 pessoas presas e acusadas no Dia do Trabalhador; em Jacarta, incluindo três dos seus colegas paramédicos. Nos protestos do Dia do Trabalhador em Bandung e Semarang também foi alegado haver infiltração por algum coletivo anarquista, levando outros a se tornarem suspeitos.

Embora a Indonésia não proíba as pessoas de terem uma ideologia anarquista ao contrário do comunismo ou do marxismo-leninismo, a polícia costuma rotular os manifestantes detidos como parte do movimento anarquista. No entanto, Oji nunca fez parte de nenhum coletivo anarquista.

Oji apresentou queixa ao Conselho de Imprensa sobre a cobertura da mídia que a identifica como “intrusa anarquista”. Embora isso tenha levado um veículo de comunicação a alterar a manchete, muitas publicações mantiveram a sua abordagem original. Oji quer fazer com que a plataforma de mídia entenda que é um problema continuar usando os termos “anarquista” e “intrusa” para identificar manifestantes ou o pessoal de suporte.

Cho Yong Gi (22), paramédico que se tornou suspeito no protesto do Dia do Trabalhador, diz que logo após ser detido pela polícia, foi questionado se era parte do movimento “anarco” ou não. “Foi a segunda pergunta depois de pedir minha identidade”, diz.

Anarquismo na Indonésia

A Instituição Policial da Indonésia publica uma série de vídeos chamada “Resposta da Polícia: Caos, Polícia Persegue Anarquistas” no site oficial. A série afirma que grupos anarcossindicalistas provocaram algumas manifestações e as levaram ao caos, nos últimos anos, citando como exemplos os últimos protestos do Dia do Trabalhador em Jacarta, Bandung e Semarang.

“Grupos anarquistas geralmente têm a característica distinta de invadir protestos, [como] vestir roupas totalmente pretas, distribuir propaganda por meio de panfletos ou grafites, destruir símbolos do Estado ou instalações públicas”, diz a narração da série. O vídeo explica três abordagens policiais ao movimento anarquista: “inteligência, prevenção e repressão proporcional” que, segundo a publicação, ajudam a equilibrar a liberdade de expressão com a ordem pública.

Recentemente, a Instituição Policial e Militar também foi ordenada pelo presidente Prabowo Subianto a tomar medidas firmes contra “ações anarquistas”. Recentemente, a Instituição Policial e Militar também recebeu ordens do presidente Prabowo Subianto para tomar medidas firmes contra “ações anarquistas”.

Quando solicitamos uma entrevista com dois funcionários da Instituição Policial da Indonésia, bem como com seu departamento de relações públicas, nenhum deles respondeu até a publicação deste artigo.

Ferdhi Putra, pesquisador independente e escritor sobre o movimento anarquista na Indonésia, afirma que o movimento anarquista cresceu desde a Reforma de 1998, e agora pode ser encontrado tanto em áreas urbanas quanto rurais em todo o país. No entanto, existe um equívoco sobre o movimento de que “anarquismo é violência, então qualquer pessoa que cometa violência é chamada de anarquista”.

A polícia já havia usado o rótulo “anarco” para descrever manifestantes em Yogyakarta em 2018, com 11 pessoas detidas. Contudo, Ferdhi argumenta que isso se tornou um padrão sistemático depois que o então chefe da Polícia Nacional, Tito Karnavian, declarou que a instituição abordaria o “problema anarcossindicalista” da Indonésia.

A declaração foi feita depois que a polícia regional de Bandung prendeu 619 pessoas que vestiam roupas pretas, depois as despiu publicamente e raspou as cabeças. A luta da instituição policial de Java Ocidental contra a comunidade anarco em Bandung continua até hoje, pois afirmam que “os anarco são inimigos comuns” no site oficial.

Ferdhi diz que o movimento anarquista na Indonésia é muito diversificado. Embora alguns usem o vandalismo como tática, principalmente contra símbolos de autoridade, como delegacias de polícia, nem todo vandalismo vem do movimento anarquista.

Com o padrão atual, Ferdhi argumenta que o movimento anarquista pode ser um novo “comunismo”, no sentido de que a autoridade identifica um inimigo comum com base na ideologia. “Isso é uma repetição. Eles (a autoridade) costumavam ter como alvo os comunistas, depois os terroristas e agora os anarquistas”, diz ele.

O desafio para as autoridades, explica Ferdhi, é que os anarquistas não têm uma organização, estrutura ou líder, ao contrário do comunismo na Indonésia. “As autoridades estão confusas para identificar quem é o responsável pelo movimento”, diz Ferdhi.

Asfinawati, professora de direito e acadêmica da Faculdade de Direito Jentera da Indonésia, argumenta que as autoridades indonésias ainda operam com a mentalidade antissubversiva da era da Nova Ordem do presidente Suharto. Durante esse período, atividades “subversivas” eram proibidas e as autoridades podiam invadir e confiscar materiais impressos, incluindo livros. As leis antissubversivas foram revogadas em 1999, e o direito de apreensão de livros terminou em 2010.

“A polícia ainda adere a conceitos autoritários nas instituições. Essa indicação fica mais ressaltada ainda nos casos de anarquistas”, diz Asfinawati. “Eles não sabem que agora temos liberdade de pensamento. Mesmo sendo anarquista, desde que não cometa crime, não há problema.”

Ela vê a narrativa anarquista como parte de um padrão antigo. “Em 1965, o comunismo era nosso inimigo comum. Sob Susilo Bambang Yudhoyono, eram as minorias religiosas, como ahmadiyah ou xiitas. Depois, veio a comunidade LGBT.”

Andi Achdian, historiador e professor da Universidade Nacional de Jacarta, oferece uma perspectiva diferente, argumentando que o anarquismo não pode ser comparado ao comunismo indonésio porque o comunismo tinha raízes históricas profundas e um poder político significativo por meio de um partido que já foi um dos maiores do mundo.

“Ele (o anarquismo) não tem uma raiz histórica forte”, diz Andi.

Símbolos como alvo

Rio Imanuel Adolf Pattinama (28), rapper, foi preso com amigos após fazer grafites com a frase “sudah krisis, saatnya membakar” (A crise já existe, é hora de queimar). Logo, eles foram presos e rotulados como “anarquistas”.

Durante o interrogatório policial, os policiais perguntaram repetidamente quem liderava o movimento anarquista. Rio e seus amigos foram posteriormente condenados por “notícias falsas, causando deliberadamente agitação entre o povo” e presos em 2020. As provas usadas contra eles incluíam uma camiseta preta com o símbolo do Círculo A e alguns livros, incluindo um livro escrito por Tan Malaka, um herói nacional, intitulado “Ação em Massa”.

“Sempre que há caos, é rotulado como anarquista, mesmo que não haja base legal”, diz Rio. “Os anarquistas se tornaram o novo bode expiatório para substituir o PKI (Partido Comunista da Indonésia).”

Ao contrário do rótulo comunista, que pode levar a grave discriminação social e exclusão, Oji diz que a designação anarquista não criou um estigma social significativo na vida cotidiana. “A verdadeira desvantagem é que isso impede as pessoas de estudar diferentes perspectivas e ideologias”, explica ela.

Oji e três colegas enfrentam acusações ao abrigo de dois artigos do Código Penal, desobediência à autoridade (artigo 216) e aglomeração e recusa deliberada de sair do local após três ordens da autoridade (artigo 218). Por outro lado, Oji está processando a polícia por alegada violência sexual e os seus três colegas estão processando a polícia por alegados abusos durante a sua detenção. Ambos os casos, nos quais são suspeitos e relataram o processo de prisão, ainda estão em andamento.

Apesar dos problemas legais, continuam trabalhando como paramédicos em manifestações durante o jovem governo de Prabowo Subianto. Enquanto isso, a polícia continua prendendo centenas de manifestantes e rotulando-os como grupos anarquistas, como visto nos incidentes recentes de agosto.

Entramos em contato e solicitamos entrevistas com o chefe da Divisão de Relações Públicas da Polícia Nacional da Indonésia, Trunoyudo Wisnu Andiko, em 19 de agosto; com Ade Ary Syam Indradi, o policial que rotulou os casos de Jorgiana Augustine e Cho Yong Gi como “anarquistas”, em 26 de agosto; e com o assessor de imprensa Jihan Isnaini no mesmo dia. Trunoyudo e Ade Ary não responderam. Jihan inicialmente respondeu à minha primeira mensagem, mas parou de responder depois que mencionei o assunto do pedido de entrevista.

Fonte: https://magdalene.co/story/will-anarchism-face-the-same-fate-as-communism-in-indonesia/

Tradução > CF Puig

agência de notícias anarquistas-ana

Soneca da tarde.
Uma brisa companheira
chega sussurrando.

Alberto Murata

[Indonésia] Somos todos titereiros

42 pessoas de redes antiautoritárias nomeadas como suspeitas após manifestações (abolir o parlamento)

De 25 de agosto a 5 de setembro, a Indonésia foi um mar de fogo. Uma onda de manifestações simultâneas terminou em batalhas de rua, incêndio de prédios governamentais e delegacias, além do saque de casas de políticos. Um total de 3.195 pessoas foram detidas em vários locais durante esse período. Isso sem contar as prisões posteriores.

Como parte das operações pós-manifestação, a polícia investigou e prendeu ativistas, administradores de contas de redes sociais de movimentos sociais e influenciadores. Esses receberam certa visibilidade, além do apoio merecido. Mas, ao mesmo tempo, na base, no nível popular, dezenas ou talvez centenas de pessoas foram presas, espancadas, isoladas do contato com suas famílias e privadas de assistência jurídica da Lembaga Bantuan Hukum – LBH (Instituto de Assistência Jurídica). Algumas foram noticiadas pela mídia local, mas a maioria permaneceu no silêncio: desapareceram de repente, e o movimento inteiro imediatamente foi forçado à clandestinidade, dominado pela paranoia.

Nossos temores são bem fundamentados. Sabemos que o Estado pode ser o perpetrador de violações de direitos humanos e de terrorismo. Temos memórias coletivas dos massacres de 1965, dos desaparecimentos de ativistas em 1998, do assassinato do ativista de direitos humanos Munir, de tudo de ruim que acontece a quem ousa lutar. Quem ousaria negar que a mesma coisa não pode acontecer novamente hoje?

Finalmente, na terça-feira, 16 de setembro de 2025, a Polícia Regional de Java Ocidental realizou uma coletiva de imprensa anunciando 42 suspeitos envolvidos em atos de vandalismo em Bandung. No entanto, todos foram resultado de uma investigação e prisões em nível nacional, realizadas até em Jombang e Makassar. Foram acusados de serem anarquistas.

Durante a coletiva, a Polícia Regional de Java Ocidental declarou que grupos anarquistas estavam envolvidos em atos de vandalismo, incitação à violência, distribuição de materiais sobre como montar coquetéis molotov e captação/gestão de fundos de organizações anarquistas internacionais no valor de 1 bilhão de rupias indonésias (60.795 dólares).

Nós não negamos essas acusações. Apenas destacamos como o governo tenta convencer o público de que a onda de revolta popular não se deve inteiramente à raiva do povo. O governo sempre pensa em uma lógica centrada no titereiro: acreditando que tudo é mobilizado centralmente por um punhado de atores intelectuais. Alguns acreditam que isso é orquestrado pela oposição política, o que é impossível, considerando a coalizão sólida de Prabowo que abarca toda a elite predatória. Outros acusam que seja obra de capangas financiados do exterior. Alguns conspiram sobre operações de inteligência militar. Ou então, que 42 anarquistas orquestraram os distúrbios.

Digamos que as acusações contra os anarquistas sejam verdadeiras. Mesmo assim, o governo ainda busca um bode expiatório, subestimando o raciocínio popular. Acham que, se milhares de membros do Partido Comunista da Indonésia (PKI), milhares de anarquistas, ou agentes estrangeiros, ou a oposição forem presos, milhões de outros indonésios, como motoristas de aplicativo (ojol), estudantes, universitários e donas de casa, não carregarão paus, não lançarão pedras, nem prepararão garrafas de vidro cheias de gasolina? Nosso governo não é estúpido. Eles negam deliberadamente e dizem: “está tudo bem.” Têm medo de admitir que o povo, isto é, todos nós, somos os titereiros.

Somos todos titereiros. Esta insurreição é a mais magnífica performance política que já encenamos. Nossa história é um roteiro ainda não escrito. Nosso diálogo começa com as palavras “Cukup!” (Basta!) e termina com “Merdeka 100%” (Independência 100%). Nosso papel é ser protagonistas de nossa própria libertação.

Em pouco tempo, a insurreição vai arrefecer, o fogo se apagará, a fumaça será levada pelo vento. Os prédios do parlamento (DPR) serão reconstruídos ainda mais fortes, o orçamento militar pós-insurreição disparará, mas as florestas dos povos indígenas continuarão a ser desmatadas, os trabalhadores ainda terão salários baixos, e o um por cento, a classe dominante, continuará a se beneficiar desse sistema explorador.

Organizemo-nos novamente, unamo-nos em sindicatos, fóruns comunitários e alianças estudantis. Vamos ler e debater, realizar formações, recrutamento e kaderisasi (regeneração/militância). Mostrar que as prisões não nos intimidam.

O Serikat Tahanan (Sindicato dos Prisioneiros) é um coletivo de prisioneiros antiautoritários. Organizamo-nos principalmente dentro, mas também fora das prisões em toda a Indonésia, para apoiar companheiros ativistas antiautoritários que foram encarcerados e para educar o público sobre as condições prisionais na Indonésia. Essa iniciativa, impulsionada por prisioneiros, começou como um simples ato de solidariedade entre nós, para cultivar esperança, para que não nos sintamos marginalizados nem saiamos da prisão mais destruídos do que entramos. Ao nos organizarmos, somos constantemente lembrados do porquê de termos começado nossa luta. Entre em contato conosco para mais informações em sociabuzz.com/serikattahanan.

Fonte: https://sea.theanarchistlibrary.org/library/serikat-tahanan-we-are-all-puppeteers-en

Tradução > Contrafatual

agência de notícias anarquistas-ana

Notícias sobre a repressão na Indonésia

By A.N.A. on 18 de Setembro de 2025

Em resumo, em todo o país, 5.444 pessoas foram presas por causa da revolta. 583 estão sob investigação. Esse é o relatório recente da instituição de assistência jurídica [www.lbhbandung.or.id]. Em 3 de setembro, a mesma organização jurídica de esquerda divulgou informações de que 3.337 pessoas haviam sido presas, então podemos ver que a repressão está ganhando força. Centenas de anarquistas foram presos.

A unidade antiterrorista indonésia “Densus 88” é basicamente um esquadrão da morte e foi ativada pelo governo. A “Densus 88” está agora caçando os círculos insurrecionalistas anarquistas, niilistas e egoístas e se concentrando nos presos. Eles tentarão acusar os companheiros já presos e os procurados por terrorismo, o que será difícil de provar em tribunal, mas a repressão pode ser sangrenta e pedimos atenção internacional e solidariedade revolucionária. A unidade antiterrorista está oficialmente caçando o mesmo círculo em Makassar. É assim que o Estado indonésio tenta criar um clima de paranoia, o que não será muito bem-sucedido.

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