Julgamento em massa de 87 ativistas por “terrorismo” durante a COP28, que levou protestos raros ao Dubai.

Esta semana, 87 pessoas aprisionadas começam a ser julgadas em massa, nos Emirados Árabes Unidos, acusadas de terrorismo, denunciou a Emirates Detainees Advocacy Center (EDAC).

Ahmed Mansour, última pessoa que trabalhava na área dos direitos humanos, dentro dos EAU, foi preso em 2017. Pela primeira vez, uma COP decorreu sem a presença de participantes da sociedade civil do próprio país que recebe a conferência.

O processo UAE87 é o segundo maior julgamento político em massa da história dos EAU, a seguir ao processo UAE94, e as acusações implicam penas severas, incluindo a morte e a prisão perpétua, nos termos do artigo 21º da lei antiterrorismo.

O EDAC denuncia que a “fabricação, pelos Emirados Árabes Unidos, de novas acusações para prorrogar as penas dos que já foram libertados, reflecte a contínua repressão da dissidência e da sociedade civil por parte das autoridades dos Emirados.

Figuras notáveis como o Dr. Sultan Bin Kayed al-Qasimi, Khaled al-Shaiba Al-Nuaimi, Dr. Muhammad Al-Roken, Dr. Hadef Al-Owais e Muhammad Al-Siddiq, bem como activistas dos direitos humanos como Ahmed Mansoor e Dr. Nasser Bin Ghaith, encontram-se entre os acusados.

Nos últimos meses, as autoridades dos Emirados Árabes Unidos terão isolado e cortado a comunicação com os arguidos do processo, obrigando-os a assinar confissões em que reconhecem o seu envolvimento na criação da organização terrorista.

Na primeira sessão do tribunal, Salem al-Shehhi, um dos arguidos, revelou ao juiz que as confissões lhe tinham sido arrancadas enquanto se encontrava na solitária. (EDAC)

Ahmed Mansoor, foi galardoado com o Prémio Martin Ennals para Defensores dos Direitos Humanos em 2015. Mansoor atraiu repetidamente a ira das autoridades dos Emirados Árabes Unidos ao apelar a uma imprensa livre e às liberdades democráticas na federação autocrática de sete xeques.

Mansoor foi alvo de um programa de espionagem israelita no seu iPhone em 2016, provavelmente utilizado pelo governo dos Emirados antes da sua detenção em 2017 e condenação a 10 anos de prisão pelo seu ativismo. No sábado, a Amnistia Internacional e a Human Rights Watch realizaram uma manifestação em que exibiram o rosto de Mansoor na Zona Azul, administrada pela ONU, num protesto cuidadosamente observado pelos funcionários dos Emirados.

Entre os 87 acusados encontra-se o ativista Nasser bin Ghaith, um académico detido desde agosto de 2015 por causa dos seus tweets. Foi uma das dezenas de pessoas condenadas na sequência de uma ampla repressão nos Emirados Árabes Unidos após os protestos da primavera Árabe de 2011. Estas manifestações levaram os islamitas ao poder em vários países do Médio Oriente, um bloco político que o governo dos EAU considera uma ameaça ao seu sistema de governo hereditário. (PBS)

Sabe mais: https://en.edacrights.com/

Um protesto raro no Dubai, no sábado, no local da cimeira da ONU sobre o clima, para exigir a libertação de activistas pela democracia presos nos Emirados Árabes Unidos e no Egipto.

Cerca de 25 activistas participaram no protesto, segurando fotografias dos prisioneiros dos Emirados Ahmed Mansoor e Mohamed al-Siddiq e do ativista político egípcio-britânico Alaa Abdel Fattah.


A ativista Indiana Licypriya Kangujam, de 12 anos, subiu ao palco da COP28, no Dubai, esta segunda feira, mostrando um cartaz que dizia “Fim aos Combustíveis Fósseis. Salvem o nosso planeta e o nosso futuro”.

A jovem ativista foi depois levada pelos seguranças enquanto o público aplaudia. Estranho, (ou não?), o embaixador do diretor da COP, Majid Al Suwaidi, “elogiou” o ato, e incentivou o público a bater palmas de novo.

Aqui está o vídeo completo do meu protesto de hoje que perturbou a sessão plenária de alto nível da ONU da .

Detiveram-me durante mais de 30 minutos após este protesto. O meu único crime – pedir a eliminação progressiva dos combustíveis fósseis, a principal causa da crise climática atual. Agora expulsaram-me da COP28. Sou uma criança que está completamente frustrada com a atual crise climática.

Somos a primeira linha de vítimas. Sinto que as questões fundamentais da eliminação progressiva dos combustíveis fósseis estão a ser mantidas de lado no processo de negociações em curso na COP28, com mais de 2500 lobistas dos combustíveis fósseis. Depois de pensar muitas vezes, decidi fazer este protesto.

Até a minha mãe tentou impedir-me, mas convenci-a de que “vai correr tudo bem”. Estou a correr os riscos da minha vida porque quero salvar o nosso Planeta e o nosso Futuro. A minha voz merece ser ouvida pelo mundo. Vamos manter-nos juntos, unindo-nos, em vez de nos dividirmos. Vemo-nos amanhã, no último dia da COP28.

Licypriya Kangujam

Os eventos da Conferência das Partes para as “Alterações Climáticas” das Nações Unidas têm sido cada vez mais sujetos à censura e perseguição de ativistas e sociedade civil.

Já na COP 27, no Egipto, patrocinada estranhamente pela Coca Cola, o ano passado, houve uma grande repressão, compelo menos 70 pessoas a irem presas nos dias que antecederam a conferência.

O “ministro do Ambiente” português, Duarte Cordeiro, também por lá andou, e provavelmente lembrou-se da tinta verde com que foi congratulado recentemente por ativistas climáticas, antes de dizer aos media portugueses que está “desiludido” com o decorrer das negociações.

Este ano, no Dubai, o “presidente” da COP28, Sultan Al Jaber, é também presidente da Abu Dhabi National Oil Company, conhecida como Adnoc, uma das maiores petrolíferas do mundo.

É uma situação ridícula que demonstra a captura das Nações Unidas ao mais alto nível pelas empresas e corporações que todos os dias trabalham para destruir o planeta e instaurar as ditaduras repressivas que conhecemos cada vez mais.

Antes do início da COP, este mês, saíram várias Leaks que mostravam como este presidente, em conjunto com dezenas de outros, se preparavam para assinar novos contratos petrolíferos durante a própria COP28, além de que a equipa que trabalhou com o sultão durante a COP vem diretamente dos quadros da sua empresa petrolífera.

“A fuga de informação inclui mais de 150 páginas de briefings preparados pela equipa da COP28 para reuniões realizadas por Al Jaber entre julho e outubro deste ano, que a CCR decidiu publicar parcialmente. Estes documentos oferecem uma visão extraordinária das discussões privadas entre o presidente da COP e figuras proeminentes do governo que participam na cimeira da ONU no Dubai”, diz o artigo publicado pelo Centro para a Reportagem Climática, lançado dias antes do começo do evento.

Em maio de 2023, o The Guardian relatou que Al Jaber foi acusado de tentar fazer uma lavagem verde de sua imagem, por meio de membros de sua equipa editar a Wikipedia para retratá-lo favoravelmente como um defensor da energia verde, enquanto minimizava seu envolvimento na indústria de combustíveis fósseis.

As edições incluíram a adição de uma citação que descrevia Al Jaber como “um aliado do movimento climático” e a sugestão de que os editores removessem a referência a um acordo multibilionário de oleoduto que ele assinou em 2019.

Um utilizador da Wikipédia, que revelou estar a ser pago pela ADNOC, sugeriu alterar a página para dizer que Al Jaber tinha simplesmente atraído “investimento internacional” na ADNOC, em vez de mencionar o acordo específico com a BlackRock e a KKR para o desenvolvimento de infra-estruturas de oleodutos.

Fonte: Wikipédia!

Durante a COP28 nos últimos dias, os protestos que decorreram foram sujeitos a censura, desde as frases que os manifestantes “podiam” dizer, até ao que podiam “escrever nos cartazes” que levaram para as ações de protesto. Nos Emirados Árabes Unidos não há qualquer possibilidade de protesto público, com grande repressão de qualquer atividade civil organizada especialmente na última década.

Mais de 100 manifestantes reuniram-se no domingo à margem da cimeira, para apelar a um cessar-fogo em Gaza.

Outra ação pacífica eclodiu na segunda-feira, quando vários activistas se reuniram em frente a uma sala de reuniões na Expo City do Dubai, onde o Presidente da COP28, Sultan Al Jaber, deveria dar uma conferência de imprensa. Os manifestantes deram as mãos e formaram uma fila exigindo a eliminação progressiva dos combustíveis fósseis.

“Se não conseguirmos uma eliminação progressiva no texto desta COP, há uma grande probabilidade de excedermos 1,5 graus de aquecimento, o que garantirá um futuro completamente inviável para jovens como eu, para pessoas marginalizadas, para povos indígenas, para pessoas de cor e para todos”.

Emma Buretta, uma ativista de 17 anos dos EUA.
via: Democracy Now

Com uma população de cerca de 10 milhões de pessoas, nos EAU, a esmagadora maioria da população são trabalhadores emigrantes, mais de 87%.

Estes trabalhadores são sujeitos a tortura, escravidão e extorsão, forçados a trabalhar em calor extremo (com temperaturas médias de 40º no verão) e sendo proibidos muitas vezes de abandonar o “local de trabalho”, onde geralmente também dormem, em recintos fechados e vigiados.

Pela primeira vez em mais de uma década a Human Rights Watch teve permissão para entrar no país, e, de forma irónica, lançou relatórios com imagens de trabalhadores ao lado do recinto da própria COP28, para ilustrar a forma como estes são tratados no país “liberal” do mundo Árabe.

O próprio recinto onde decorreu a COP28 que agora termina, foi construído com trabalho forçado e abusos gritantes aos trabalhadores.

Amy Goodman, do Democracy Now, tentou entrevistar o Sultão Al Jaber, sem sucesso, num video que podia ser engraçado, se não fosse tão triste. (ver: 1m:50s)