15 associações comunitárias lançam Carta Aberta de Compromisso para o alargamento dos Programas de Consumo Vigiado

https://www.gatportugal.org/noticias/organizacoes-desafiam-camaras-e-icad-para-alargar-os-programas-de-consumo-vigiado-de-drogas-ate-2026_247

https://www.gatportugal.org/public/uploads/publicacoes/CARTAD_1.pdf

Assunto: Carta de Compromisso para o alargamento dos Programas de Consumo Vigiado.

As organizações e pessoas abaixo assinadas, que trabalham com Pessoas que Usam Drogas, têm defendido o aprofundamento do modelo português de políticas de drogas e das grandes reformas de 1996-2001 que culminaram na descriminalização da posse e uso de drogas e na criação de uma rede de respostas socio-sanitárias, hoje
reconhecidas internacionalmente como boas práticas.

Os programas de consumo vigiado, com enquadramento legal desde 2001, podem ser da iniciativa de câmaras municipais ou de organizações da sociedade civil, cabendo a sua autorização ao organismo que tutela a área das dependências, atualmente o ICAD. Estas estruturas podem ser financiadas ao abrigo do Programa de Respostas Integradas ou, nos primeiros anos, como sucedeu em Lisboa e Porto, pelas respetivas câmaras municipais. Após o período experimental, os programas de consumo vigiado são financiados a 80% pelo ICAD, havendo, nalguns casos, cofinanciamento das autarquias para os restantes 20%.

Só em 2019, 18 anos depois da lei entrar em vigor, vimos ser implementada a primeira estrutura do país em Lisboa, o
programa de consumo vigiado móvel, com cocoordenação GAT/ Médicos do Mundo. Seguiu-se, em 2021, a estrutura fixa coordenada pela Associação Ares do Pinhal, também em Lisboa e, em 2022, inaugurou-se o terceiro programa na cidade do Porto, coordenado por um consórcio liderado pela APDES.

Neste momento, estima-se que o fenómeno do consumo a céu aberto persista ou tenha até conhecido um agravamento em várias cidades do país. As dinâmicas locais são diversas, mas em comum há um perfil de utilizador que se encontra numa situação de grande vulnerabilidade, a maioria das vezes sem abrigo, com dificuldades de acesso ao Serviço Nacional de Saúde e aos apoios sociais formais, e com necessidades complexas que entrecruzam diversos setores – saúde, segurança social, habitação, justiça, emprego, formação. A este fenómeno não são alheios o envelhecimento da população que usa drogas, a crise da habitação, os problemas de saúde mental e a escassa cobertura de respostas nesta área, as baixas qualificações e dificuldades de inserção no mercado laboral, as desigualdades sociais que se traduzem na pobreza e exclusão de determinadas comunidades.

Não sendo os programas de consumo vigiado uma varinha mágica que tudo resolve, eles podem desempenhar um papel essencial e de primeira linha no contacto com uma parte da população que usa drogas e que está à margem.

Há um grande consenso entre especialistas, sociedade civil e várias forças políticas, que estas estruturas são muito necessárias para oferecer um ponto de entrada no sistema social e de saúde às pessoas com consumos de elevado risco, que apresentam necessidades prementes na área da saúde e que enfrentam um contexto de pobreza e exclusão social.

Os programas de consumo vigiado devem ser adaptados às dinâmicas locais, inseridos na rede de respostas existente e planeados e dimensionados de forma adequada para prevenir disrupções nos locais onde é implementado. Os programas devem ser capazes de responder de forma eficaz tanto às necessidades dos seus utilizadores quanto
às preocupações das comunidades vizinhas, procurando melhorias relativamente ao fenómeno do consumo a céu aberto. Estes programas devem também agregar vários serviços e assegurar a referenciação às estruturas do SNS e aos serviços de apoio social formal.

Por uma questão de justiça e equidade territorial, estas estruturas não podem apenas existir em Lisboa e Porto, sendo necessário que o alargamento a outras cidades seja previsto. Por isso, incluímos nesta comunicação as câmaras municipais de Almada, Amadora, Braga, Coimbra, Espinho, Faro, Gondomar, Maia, Matosinhos, Setúbal, Viana do Castelo e Vila Nova de Gaia, além de Lisboa e Porto, onde estas estruturas já funcionam.

Assim, vimos propor:

  1. A criação de um grupo de trabalho com vista ao planeamento do alargamento dos programas de consumo vigiado, com participação de representantes do ICAD, câmaras municipais, organizações da sociedade civil e das pessoas que usam drogas, e outros organismos do estado que se considerem relevantes para o efeito;
  2. O compromisso de se estudarem as melhores soluções de financiamento, que não onerem excessivamente as autarquias locais ou as organizações da sociedade civil;
  3. O lançamento até ao final do ano de 2024 de uma proposta, com os resultados do grupo de trabalho, para o alargamento dos programas de consumo vigiado a executar até 2026.

As organizações e pessoas abaixo assinadas,

Acompanha – Cooperativa de Solidariedade Social

APDES – Agência Piaget para o Desenvolvimento

Arrimo – Organização Cooperativa para Desenvolvimento Social e Comunitário

Associação Ares do Pinhal

Associação CASO (Consumidores Associados Sobrevivem Organizados)

Associação Kosmicare

Associação Médicos do Mundo

Associação Sol do Ave

Centro Comunitário de Esmoriz

Centro Social de Paramos

Crescer – Associação de Intervenção Comunitária

GAT – Grupo de Ativistas em Tratamentos

InPulsar – Associação para o Desenvolvimento Comunitário

IPSS Florinhas do Vouga

Marta Borges

Marta Pinto