Mais de 115 coletivos e organizações nacionais e ibéricas assinam manifesto em solidariedade com os 7 anos de luta no Barroso

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Mais de 115 coletivos e organizações nacionais e ibéricas subscreveram o “Manifesto em solidariedade com os sete anos de luta na região do Barroso“. Entre elas, destacam-se a QUERCUS – Associação Nacional de Conservação da Natureza; a APA – Associação Portuguesa de Antropologia; o GEOTA – Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente; a Campo Aberto – associação de defesa do ambiente; a AZU – Ambiente em Zonas Uraníferas; e a ÍRIS – Associação Nacional de Ambiente.

O manifesto sublinha “a resistência das populações locais contra a falsa transição verde e o extractivismo liberal”, classificando o momento atual como “dramático”, pois “o Estado português impôs uma decisão burocrática (a “servidão administrativa”) que autoriza a empresa a entrar nos terrenos colectivos (baldios) e também nos terrenos privados”. Uma decisão “anti-democrática” que coloca as populações “em legítima defesa”, lê-se ainda.

Denunciando o “paradigma do extrativismo” — que “há séculos destrói comunidades e territórios” e que “agora apela ao mantra da desmaterialização e da transição energética para recauchutar a indústria automóvel, mineira, militar e fóssil” — o manifesto contesta a cumplicidade entre o “Estado e as corporações multinacionais, prontos para sacrificar mais um território”.

Em destaque no conteúdo desta iniciativa da sociedade civil estão os impactos ecológicos, designadamente “os elevados riscos ambientais locais e para toda a bacia hidrográfica do Douro”. A argumentação do manifesto apoia-se nas “conclusões inequívocas” do estudo realizado pelo Prof. Dr. Steven Emerman, especialista mundial em Mineração, Hidrologia e Geofísica. Este parecer explica criteriosamente as amplas consequências ambientais e a absoluta falta de inaptidão do projecto da Savannah Resources no contexto eco-sistémico em que se insere,  deformidades que podem levar “a uma falha catastrófica da barragem de rejeitados”.

O manifesto, que em apenas duas semanas superou a centena de subscritores a título coletivo e foi assinado individualmente por mais de 850 cidadãos, está em aberto para assinaturas aqui.

https://gatovadiolivraria.blogspot.com/2025/01/manifesto-em-solidariedade-com-as.html

MANIFESTO

Manifesto em solidariedade com os sete anos de luta na região do Barroso

A resistência das populações locais contra a falsa transição verde e o extractivismo liberal

A BALANÇA da justiça nunca pesa o que devia. E a crise do espectáculo global das forças da mentira e das várias faces da sua violência encontram a resistência no campo da vida, no campo da verdade da vida vivida.

Será possível que a chamada transição verde, na fase actual de colapso produtivista, destrua uma das primeiras regiões Património Agrícola Mundial (FAO/UNESCO) da Europa, em nome do extractivismo do lítio?

É racional que um projecto de mineração, empreendido por uma empresa que nunca extraiu um mineral que fosse do chão da nossa terra – aqui e em qualquer lugar do Planeta – e sem qualquer experiência em mineração, possa acabar com um dos territórios europeus com maior bio-diversidade, fruto da relação harmónica  e ancestral entre os seus habitantes e os recursos naturais?

É normal que um projecto de expansão do colonialismo liberal submeta as populações e o poder local contras as suas vontades e no coração de uma das pouquíssimas regiões da Europa onde a propriedade dos montes e das serras, das terras de pasto e do usufruto dos rios, nem é propriedade privada nem estatal, mas é propriedade colectiva do povo, uma forma de jurisdição característica do comunitarismo e mais antiga que a própria fundação de Portugal?  

Será justo que uma multinacional que nunca produziu nem um tostão furado nem extraiu um torrão de terra já tenha ganho milhões, à custa da angústia, da incerteza e das ameaças às nossas avós, apenas por estar no Alternative Investment Market da Bolsa de Londres?

Não é normal, nem racional, nem as populações querem que se torne possível o que está a acontecer na Região do Barroso, no Norte de Portugal. Nem, muito menos, é justo.

Um processo de sete anos de luta das populações, mas também do poder municipal, contra os interesses opacos do mercantilismo extractivista, que deve chegar agora ao conhecimento mais amplo da sociedade, no momento dramático em que o Estado português impôs uma decisão burocrática (a “servidão administrativa”) que autoriza a empresa mineradora a entrar nos terrenos colectivos (baldios) e também nos terrenos privados, contra a vontade das organizações colectivas (Juntas de compartes) que gerem os baldios e dos particulares/privados, que vêem assim as suas terras invadidas. Uma decisão anti-democrática que nos coloca em legítima defesa.

O paradigma do extrativismo, assente em políticas expansionistas e de acumulação do capital, há séculos que destrói comunidades e territórios. No tempo presente, a mesma deriva política responsável pela sexta extinção em massa e a destruição dos sistemas ecológicos locais e globais, apela agora ao mantra da”desmaterialização” e da “transição energética”, para recauchutar a indústria automóvel, mineira, militar e fóssil. O Estado e as corporações multinacionais, ambos dominados pelas práticas liberais e suas insanáveis contradições, estão prontos para sacrificar mais um território, dividir para reinar e criminalizar as lutas.

Do ponto de vista dos elevados riscos ambientais locais e para toda a bacia hidrográfica do Douro, as conclusões do estudo do geólogo e Prof. Steven Emerman (Princeton University) são inequívocas: o projecto da “Mina do Barroso” pode levar a uma falha catastrófica na barragem de rejeitados proposta pela empresa promotora. O especialista mundial em Mineração, Hidrologia e Geofísica, durante vários anos presidente do Subcomité do Corpo de Conhecimento da Sociedade de Barragens dos EUA, apresenta diversas razões fundamentadas para rejeitar o projecto da “Mina do Barroso”, entre as quais destacamos: o facto de a barragem de rejeitados propor um método de construção que é ilegal em diversos países, nomeadamente no Brasil, Chile, Peru e Equador; e o facto de a barragem de rejeitados ficar muito perto do Rio Covas (a menos de 1 km), o que seria ilegal em países como a China.

No fundo, há mais amor e justiça nas barrosãs que pastam livremente pelos montes colectivos do que na bolsa de activos do mercado do lítio. Há mais humanidade na cozinha das nossas avós do que nos corredores do poder.

Aqueles que amam demasiado as coisas e não o bastante os seres viventes, aqueles que só amam os outros seres se os objectivarem e os tornarem coisas, se os escravizarem ou aniquilarem, não podem passar. Essa ordem das coisas que impede o que resta da autenticidade da vida não vai passar porque a sede de viver em paz é inesgotável.

A empresa especulativa e o seu projecto de mineração já são pura arqueologia, uma montra de antiquário, um fóssil da sua própria falência, um caco a mais no museu do fim do capitaloceno.

Há muito que caçámos a mentira do liberalismo cultural no fojo da nossa boca.

Por isso, respigamos as palavras do último comunicado da associação Unidos em Defesa de Covas do Barroso:

“A única coisa normal aqui é RESISTIR. Em defesa da Serra e dos modos de vida que dela dependem. E por um combate à crise ecológica justo, que apenas sacrifique os responsáveis pelo estado a que chegámos.

Não somos nem seremos meros territórios de extração. E nunca desistiremos de lutar: contra uma empresa, um Estado e todos aqueles que se uniram para acabar com a nossa comunidade.

Os lobos voltam a uivar na Serra!”

Porque o que se ensina hoje na luta no Barroso existe desde sempre na raiz que nos criou.

Nós abrimos os olhos durante a noite.

Os pirilampos já voltaram ao monte.

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